03/10/2011

A arte de perdoar

Em meio à turbulência do dia-a-dia e a ansiedade que nos rouba o ar, a inspiração e a poesia, de repente o tempo parou e eu fiquei observando a relação de duas pessoas.

O homem maduro apóia com cuidado o frágil corpo de sua mãe. Sua boca alcança suas mãos com os sinais do tempo.

Que doce o olhar daquele homem! Gestos suaves, uma concentração atribuída, afeto transbordante, e por que não dizer a beleza em perfeição.

A mãe carente e desconcertada, inquieta e aflita, ainda reclama que a natureza do afeto não era bem o que desejava...

Fica clara a inversão. É o filho quem alimenta afetivamente a mãe.

Como na natureza afetiva, primeiro nós recebemos e depois doamos, surge então o questionamento: de onde se alimenta este homem para se obter este manancial de afetos e cuidados, irradiando admiração e doação?

Que mistérios se escondem no equilíbrio contido nesta paz?

─ A necessidade de aprender a perdoar. Sim. É possível acreditar num mundo melhor – construído por pessoas melhores. Perdoar! Habilidade esta, infinitamente a descobrir e a construir.

Não perdoamos o outro e sim a nós mesmos. Porque ninguém entra no mundo do outro, no relacionamento apenas nos inspiramos do outro um jeito diferente de agir e sentir.

Devemos sim, perdoar a nós mesmos pelos vazios não percebidos, inconscientes – aquelas necessidades imprescindíveis do nosso mundo interior. Devemos sim, aceitar nossas frágeis fases de dependências.

Perdoar é trazer de volta, é recuperar a inocência e a espontaneidade perdida. Acreditar sim, que os pais nasceram para proteger, as crianças para renovar, os artistas para encantar, os professores para guiar, os médicos para curar – que a mão que nos leva a passear num dia ensolarado é doce e acolhedora. Acreditar que o que norteiam as funções de cada ser humano são a pureza, a transparência, a simplicidade e a entrega.

Perdoar é perceber que cada pessoa que se aproximou de nós, nos amou da forma que poderia, nos concedeu o amor que se estendeu de si mesmo. E que muitas vezes não o tinha para ofertar, mas ofereceu o que podia e da forma que dispunha.

Porém, estas atitudes não significam negar a dor. Pois o vazio de uma necessidade não preenchida causa dor em demasia. E sempre haveremos de buscar um equilíbrio melhor, uma condição que nos proporcione um acolhimento mais terno. Seja esta necessidade de liberdade, proteção, comunicação, intimidade entre outros sentimentos. Pois o fato é que, por mais amados que sejamos pelos nossos pais sempre haverá lacunas, e que nosso desejo da compreensão de nossa natureza e essência original é função pessoal, um trabalho de amadurecimento interno.

Portanto perdoar, passa pelo comprometimento daquilo que nos falta ─ resignificar aquelas necessidades não completadas.

Assim seremos capazes de seguir em frente, íntegros e dignos, saindo de um sistema de desprazer, dor e sofrimento para um sistema de autonomia, autodomínio ─ uma individualidade construtiva, quebrando o padrão da repetição, do ciclo vicioso de desafetos, transmutando vazios internos em construções afetivas seguras.

Perdoar é estarmos conscientes de nossa capacidade de criar laços.

Um comentário:

  1. Obrigado minha Estrela, embora estejamos fisicamente distantes, meu amor por voce é permanecerà eterno e imutàvel, propriamente um atributo perfeito... Tente, me perdoar pelo silencio, pelos vazios não percebidos, inconscientes – aquelas necessidades imprescindíveis do nosso mundo interior. Tente sim, aceitar nossas frágeis fases de dependências.

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